quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Jornal retrata vida do bancário desde os anos 20


Cedoc dos Bancários de SP, Osasco e região abriga desde o primeiro exemplar da publicação, preciosidade para a imprensa sindical
Poucas empresas ou entidades possuem centros de documentação e memória. A maioria, em geral, sequer tem um espaço destinado a organizar seus arquivos de documentos, fotos, vídeos, CDs. Com isso, uma parte preciosa de sua história, quando não toda ela, vai pelo ralo. A situação é ainda pior quando se trata de organizações que, em algum momento de sua existência, passaram pela mão de interventores, como é o caso dos sindicatos – por propósito ou total desleixo, importantes documentos históricos simplesmente desaparecem nestes períodos.
Uma valiosa exceção, ao menos no que tange à hemeroteca, é o Centro de Documentação do Sindicato dos Bancários de SP, Osasco e região, localizado no subsolo do prédio Martinelli. Embora sem microfilmagem, ali estão todos os exemplares do informativo da entidade a seus associados, desde a criação do boletim Vida Bancária em – pasme! – 1928. São 83 anos de informações que vão muito além da experiência de uma categoria ou de uma entidade sindical: a história brasileira desde os primeiros anos do século 20 e os conflitos que abalaram o mundo, como as guerras, a ascensão do comunismo em Cuba, a divisão promovida pela disputa capitalismo x comunismo. Sem esquecer, claro, fatos que beiram a contemporaneidade, já na virada do novo século, como o movimento pró-Diretas, a guerra no Iraque etc, etc.
 Muitas vezes tenho recorrido a este local, já que sua fonte é única (não há exemplares da Vida Bancária nem da Folha Bancária, nome do boletim sucessor ainda na ativa, em outros centros de referência da memória sindical) e o atendimento precioso. É delicioso, para além dos fatos e informações sobre política e economia, desvendar um passado em que ainda se discutia a chegada da mulher ao mercado de trabalho ou se ofereciam aulas de esperanto. Percebe-se claramente, na linha do tempo, o momento em que os sindicatos brasileiros deixam de ser meramente entidades formais e “amigas” dos donos de empresas para dar início à luta de classes. E, muito mais tarde, pelos caminhos da negociação. Imperdível para os que, como eu, adoram viajar pela memória atemporal.
Bom, agora tenho visitado o Cedoc para buscar informações sobre o Sindicato dos Bancários de Pernambuco. (Peço, inclusive, que, se você, leitor, tiver qualquer informação sobre essa história, que tem origem em 1931, entre em contato comigo). Muito já encontrei ali – o único problema é me desvencilhar das outras tantas histórias registradas, que acabam me enredando para além de qualquer fronteira. Mas esse também já é outro capítulo.... Espero, sinceramente, que esse precioso acervo jamais se perca, e possa, rapidamente, ser microfilmado com segurança para os leitores do futuro.

Um homem centenário numa noite de sábado

E uma história, e outra, e mais um poema....
Poucas pessoas têm a oportunidade de chegar – ou ultrapassar - os 100 anos. Deve surpreender até mesmo a quem chega lá. Outro dia, vivi a experiência de conhecer um homem centenário bem de pertinho – não assim como saber do Oscar Niemeyer, mas lado a lado. Foi numa noite de sábado, numa casa tranqüila e de gente amiga, bom refúgio em qualquer idade. Fiz um poema sobre esse encontro, acertadamente disponível para leitura em Poemas do Tempo.

Militares nas empresas durante a ditadura

São Bernardo abre novo capítulo da história com o relato de trabalhadores e ex-funcionários das múltis no período ditatorial
São Bernardo começou a discutir mês passado a presença de militares em empresas da região durante a ditadura. Felizmente, pude presenciar in loco apenas o final desse cruel relacionamento, embora, como filha de metalúrgico, tenha acompanhado também os momentos mais duros ao longo dos anos 70.
 Mas recordo muito bem que, no final de 1984, quando ingressei na Volkswagen do Brasil como estagiária de jornalismo, a ditadura, em tese, já agonizava (agentes do antigo Deops, porém, continuavam a espionagem, como se pode ler na matéria já publicada neste blog – A ditadura inconformada).  Assim, supreendeu à estudante que eu era o fato de termos de liberar o jornal da empresa (Jornal da Gente) com um coronel, que se reunia com a equipe para aprovar ou não os textos. Ele era uma espécie de chefe do departamento de Relações Industriais (naquele tempo não se usava o ´institucional´), ao qual a Imprensa, vinculada ao depto de Relações Públicas, se curvava - nada podia ´melindrar´ o tal censor.
A história curiosa é que ao final do estágio, quando fui promovida a ´praticante de jornalismo´, fiz uma reportagem sobre velhos trabalhadores que haviam ingressado na empresa em 1968/1969. Obviamente o texto citava fatos do período: chegada do homem à lua, AI-5 etc. O tal coronel (acho que se chamava Amorim) cortou todas citações e, quando fui reclamar que não havia sequer me informado anteriormente, perdi o emprego. A alegação? Corte de vagas, embora não fizesse nem um mês que havia sido promovida e na sequência outra pessoa fosse contratada para o lugar.
Eu já sabia, na época, que a melhor coisa que podia ter me acontecido naquele momento era deixar a imprensa institucional, porque pensava (e ainda penso) que na minha profissão não se aprende completamente sem ter passado pelo jornalismo diário, embora tenha feito grandes amigos na assessoria da VW, convivendo com jornalistas da melhor qualidade. Mais tarde, trabalhando na Confederação Nacional dos Metalúrgicos da CUT, pude inclusive ver cartilhas que multinacionais produziam para orientar o procedimento "em caso de greve", com determinações que lembravam um estado de guerra, muito distante do respeito à negociação hoje conquistada.
Com certeza, muitos outros relatos virão sobre o tema, em especial daqueles que trabalharam nas múltis durante os anos mais cruéis da ditadura brasileira. Serão novos capítulos de uma longa noite, indispensáveis para o contar da História e – claro – para manter aceso seu lume.

domingo, 21 de agosto de 2011

Manuscritos na net

O Arquivo Público de SP oferece ao internauta uma nova exposição virtual: Manuscritos na História, que objetiva apresentar um pouco das mudanças ocorridas nos documentos produzidos desta forma  até esse começo de século 21. Inventários, cartas, ofícios, processos, são alguns dos textos manuscritos que podem ser lidos pelo site do Arquivo. Além disso, também é possível visitar as mostras passadas. Confira no  
http://www.arquivoestado.sp.gov.br/exposicao_manuscrito/

Velho Sylvio


Turma da professora Albertina, do segundo ano primário do Grupo Escolar Sylvio Romero, em 1971


A escola Sylvio Romero, uma das participantes do projeto citado abaixo, passou por diversas modificações desde sua criação (veja foto do prédio nos anos 50, da Fundação Pró-Memória de São Caetano). Perdeu muito de sua área verde e ganhou em anexos e salas de aula. Nos anos 70, o grupo escolar era também conhecido por 'Lixão', embora nenhum lixão existisse ali dentro, e o nível de ensino fosse muito bom - a referência, possivelmente, estava relacionada a um aterro que existira próximo. No grupo ministravam aulas professoras como dona Maria Ângela, dona Albertina e dona Maria Esther. Em seu entorno, além da padaria que ainda está lá, na esquina das ruas Vital Brasil com a Castro Alves, ficavam a farmácia do Seu Brás (ou seu Chico, o proprietário mais velho) e a papelaria da família Duran.
Ceolin, Monteiro, Pan, Duran, Alonso, Gallo, eram alguns dos sobrenomes das crianças que estudavam no Sylvio Romero naquele tempo. Há cerca de cinco anos tive o prazer de falar com alunos de novas gerações da escola sobre jornalismo - puro deleite, já que Ferrasoli era também um dos sobrenomes da turma de 1970. E a convite de uma mestra tão querida quanto as do passado, a professora Aparecida Sasso que, ex-estudante da casa, ainda leciona ali.

A história no fundo do baú

São Caetano inaugura nesta quinta a exposição do projeto Vamos Contar Nossa História, que envolveu estudantes de seis escolas de ensino fundamental da cidade. As crianças desenvolveram atividades para responder a questões como 'Do que minha mãe brincava quando era pequena?', Qual foi a profissão do meu avô?; ou seja, foram estimuladas a buscar sua própria história ao desvendar a de seus antepassados, resgatando nomes, tempos, características e culturas.
A exposição, no Museu Municipal, poderá ser visitada até 23 de setembro, de segunda a sexta-feira (das 9h/17h) e aos sábados (9h/15h). O Museu fica na rua Maximiliano Lorenzini 122, no Bairro da Fundação. As escolas participantes são as EMEFs Sylvio Romero, Eda Mantoanelli, Dom Benedito, Elvira Braido, Luiz Capra e Décio Gaia. 

domingo, 14 de agosto de 2011

Mês de sobressaltos

Agosto costuma ser mês de grandes sobressaltos. Num agosto começou a ser construído o muro de Berlim; noutro, no Brasil, um presidente se matou e outro preferiu a renúncia. Agosto já deu nome a livro e a poema, e esse que segue é do poeta Ferreira Gullar

Agosto 1964
Entre lojas de flores e de sapatos, bares,

mercados, butiques,
viajo
num ônibus Estrada de Ferro-Leblon.
Volto do trabalho, a noite em meio,
fatigado de mentiras.
O ônibus sacoleja. Adeus, Rimbaud,
relógios de lilazes, concretismo,
neoconcretismo, ficções da juventude, adeus,

que a vida
eu a compro à vista aos donos do mundo.
Ao peso dos impostos, o verso sufoca,
a poesia agora responde a inquérito policial-militar.

Digo adeus à ilusão
mas não ao mundo. Mas não à vida,
meu reduto e meu reino.
Do salário injusto,
da punição injusta,
da humilhação, da tortura,
do terror,
retiramos algo e com ele construímos um artefato
um poema
uma bandeira

As vozes dos operários suspensas nas paredes


Vazamento no Congresso leva a descoberta de mensagens deixadas pelos trabalhadores no ano de 1959

O destaque não foi grande, mas a imprensa noticiou na semana que passou a descoberta de mensagens deixadas pelos operários que construíram o Congresso Nacional. Na opinião da autora deste blog, um tesouro precioso, não só porque muito distante dos discursos vazios que por vezes enchem aquela casa, mas também porque, como garrafa no mar, busca um destinatário inexistente mas que pode fazer toda a diferença. Singelas e esperançosas, as frases são datadas de abril e setembro de 1959, poucos meses antes da inauguração de Brasília, em 21 de abril de 1960

Os escritos foram descobertos por causa de um vazamento no Salão Verde da Câmara dos Deputados. Os operários deste tempo encontraram as mensagens de seus colegas do século passado, escritas nas paredes do local onde estava o vazamento. Aqueles que fizeram as frases possivelmente não imaginavam que seriam lidas, já que o local é fechado, sem circulação de pessoas – pelo divulgado, só duas delas estão assinadas. Talvez, inclusive, seus autores (como seria bom conhecê-los hoje, não?) tivessem medo que fossem lidas naquele momento. Deixaram, portanto, suas vozes suspensas nas paredes, uma mensagem para os brasileiros do futuro. Veja abaixo as frases encontradas:

"Se todos os brasileiros fossem dignos de honra e honestidade, teríamos um Brasil bem melhor"

"Só temos uma esperança, nos brasileiros de amanhã" 22/4/59

"Brasília de hoje, Brasil amanhã"

"Amor palavra sublime que domina qualquer ser humano" Nelson

"Saudade: palavra que nunca morre, quando morre fica arquivada no coração"

"Que os homens de amanhã que aqui vierem tenham compaixão dos nossos filhos e que a lei se cumpra" José Silva Guerra 22/4/59

domingo, 7 de agosto de 2011

Carros antigos na bodega

Comer e beber bem, visitar as parreiras e o processo de fabricação de vinho, degustar as variedades produzidas são algumas das opções oferecidas pelas bodegas uruguaias. Na Bouzas, além desses prazeres, dá ainda pra fazer uma rápida viagem no tempo, a começar pelo vagão de trem de 1929 em exposição ao ar livre ou visitando o galpão em que estão cerca de quatro dezenas de modelos de veículos, entre motocicletas e automóveis (foto). Ali estão modelos antigos (a partir dos anos 20) preservados e, segundo o guia, ainda em perfeito funcionamento.

No estádio do Centenário, um especialista em futebol brasileiro


Gerardo, o guia faz-tudo, é a verdadeira enciclopédia do futebol brazuca em terras uruguaias

O estádio Centenário, localizado em Montevidéu, tem um museu do futebol instalado em dois pavimentos, em que estão principalmente recortes de jornais e grandes fotos dos momentos mais importantes disputados pela seleção uruguaia - entre elas, claro, em tamanho gigante, a vitória sobre o Brasil em 1950 no Maracanã. Como muitos outros locais e serviços no País não tem nada de sofisticado ou moderno, mas cumpre muito bem seu papel informativo. Mais: cumpre mais. Porque, embora não possa ser comparado a museus do futebol pelo mundo - como do Boca, na Argentina; Santiago Bernabéu, na Espanha, ou mesmo o museu do Pacaembu, em SP - possui uma atração inesperada. É Gerardo, o guia, que, há três anos na função, sabe absolutamente tudo sobre futebol.... no Brasil!
Ele conta que, de tanto receber visitantes brasileiros aprendeu um pouco da geografia do País a partir dos times existentes nas cidades e campeonatos disputados. Sabe, por exemplo, que na 'república de Ribeirão Preto' (sim, em referência a Antonio Palocci...) os times principais são Comercial e Botafogo de Ribeirão Preto; que em Natal o clássico é ABC x América; conhece a rivalidade dos campineiros Guarani e Ponte e Preta e que o América mineiro leva o nome de coelho. O que não vem dos informantes que visitam o museu Gerardo aprende acompanhando o Globo Esporte, quando assiste até mesmo as disputas da série B.
Atencioso, ele leva os visitantes até o campo, ajuda a operar a máquina de café e ainda trabalha na lojinha do museu, cujo acervo reúne também informações sobre o projeto original do estádio, sua inauguração, móveis da antiga Associação Uruguaia de Futebol e tela do artista uruguaio Carlos Villaró. Verdadeira enciclopédia do futebol brazuca nos pampas, Gerardo não se faz de rogado quando questionado sobre o nome da real enciclopédia nacional:
'Nilton Santos', responde, sorrindo.

Uruguai, julho 2011



País das grandes planícies festeja bicentenário com o troféu da Copa América; ao olhar estrangeiro, a sensação de um povo carregado de esperança








Comemorações na Praça, com a presença de Mujica (de boina)


O Uruguai comemora neste ano seu bicentenário de independencia, e no último 18 de julho (data que dá nome a uma das principais avenidas de Montevidéu) o presidente da república José Mujica participou de solenidade comemorativa na Praça da Matriz. Ao observador estrangeiro, como esta autora, impressionou a absoluta ausência de ostentação, tanto no ato em si quanto na segurança. Caminhando pelo meio do público, ladeado de um pequeno grupo de aliados, Mujica não teve palanque nem foguetório. Igualmente singelas, as placas de reivindicações de aposentados ou em defesa da reforma agrária feitas em folhas de sulfite e escritas `a mão nem de longe lembravam as grandes faixas e balões das manifestações brasileiras contemporâneas. Coincidentemente, neste mesmo dia os jornais uruguaios traziam como manchete a morte do ditador e ex-presidente Juan María Bordaberry (1972-1976), que cumpria prisão domiciliar depois de ter sido condenado pelos crimes cometidos durante seu mandato.

`As vésperas de disputarem a final da Copa América, os uruguaios deram ao olhar estrangeiro a ideia de um país muito parecido com um Brasil dos anos 70, mas, talvez pela disputa próxima nos gramados, talvez pelos novos rumos adotados na política, de um nacionalismo intenso carregado de esperança. Ao menos no futebol, a torcida já deu certo, já que os uruguaios bateram os paraguaios na grande final. Tomara que os muitos ventos que navegam pelo caudaloso Prata tragam também aos habitantes daquele país de planícies sem grandes acidentes geográficos (o morro mais alto ali tem pouco mais de 500 metros de altura) o desenvolvimento esperado. Tomara. Porque assim merece o pequeno vendedor do mercado do Porto, cujo nome não soube mas será sempre o encantador ' Purf' , e toda sua geração.



domingo, 10 de julho de 2011

Morre inspirador de 'A Vida é Bela'


Rubino Romeo Salmoni sobreviveu a campos de concentração na Itália e Polônia



Filme levou o Oscar em 1999




Morreu no último sábado, em Roma, aos 91 anos, Rubino Romeo Salmoni, o judeu que inspirou o roteiro do longa vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro em 1999, A Vida é Bela, de Roberto Benigni. Salmoni nasceu na capital da Itália em 22 de janeiro de 1920 e foi enviado à Auschwitz, na Polônia, em abril de 1944. O campo de concentração serviu para o extermínio de milhões de pessoas, principalmente judeus, nos três últimos anos da II Guerra Mundial, no projeto batizado por Adolf Hitler de Solução Final para a Questão Judaica. Ele também passou pelo campo de concentração de Fossoli, ao norte da Itália, o que descreveu como o início da "longa viagem em direção à morte". Sua vida foi contada em diversos trabalhos, o mais recente deles, Ho Sconfitto Hitler (Derrotei Hitler, em português). "A cada manhã, você podia ver as pobres criaturas conectadas às redes com fios de alta tensão. Eles estavam cansados de sofrer e abandonados à misericórdia de Deus para acabar com o inferno da fome de cada dia", descreveu Salmoni, identificado durante a guerra com o número A1581 no braço.

Ao relatar sua trajetória Salmoni foi um dos principais responsáveis por chamar a atenção do mundo aos horrores praticados contra judeus na Itália durante a II Guerra Mundial, conflito responsável por acabar 60 milhões de vidas em seis anos, o equivalente a quase 1/3 da população brasileira, sendo 10% judeus. "Salmoni dedicou sua vida a manter viva a lembrança, certo de que só a memória pode ser capaz de impedir o retorno dos monstros do passado", afirmou o presidente da Câmara dos Deputados italiana, Gianfranco Fini. O filme A Vida é Bela relata os horrores dos campos nazistas e a esperança do principal personagem na vida, como forma de proteger o filho e a si mesmo de tamanha atrocidade.

Vida e morte de Maria Bonita

Maria Bonita: oito anos no cangaço ao lado de Lampião renderam fascinantes histórias, inclusive sobre os filhos do casal



A rainha do cangaço


No próximo dia 28 faz 73 anos que morreu Maria Bonita, a cangaceira mais famosa do Brasil, mulher de Lampião. Nascida no sítio Malhada da Caiçara, do município de Paulo Afonso, na época município de Glória, na Bahia, Maria Gomes de Oliveira já havia sido casada e morava na fazenda dos pais quando começou a namorar Lampião, com quem viveu durante oito anos. Eles tiveram filhos - uma delas seria Expedita Ferreira Nunes, deixada para um casal de amigos vaqueiros criar. E possivelmente mais um menino, embora também se cogite a possibilidade de gêmeos: a história é muito curiosa e cercada de mistérios, como descreve o pesquisador João de Sousa Lima:

"Das quatro gestações da Cangaceira, sabíamos apenas sobre Expedita Ferreira da Silva, ainda viva e residindo em Aracaju. Quando comecei a escrever o livro: "A Trajetória Guerreira de Maria Bonita, A Rainha do Cangaço", sempre que perguntava aos meus entrevistados detalhes sobre os gêmeos Arlindo e Ananias, irmãos de Maria Bonita, ou obtinha o silêncio por resposta ou escutava um curto e desafiador resmungar: Ananias não é irmão de Maria Bonita não! Tive que me desdobrar para conseguir alguém que me explicasse mais abertamente essa afirmativa. Durante dias busquei os informes dos familiares e amigos que conviveram com Maria Bonita nos conturbados dias do cangaço. Um dos primos de Maria, um senhor chamado Manuel Maria dos Santos, apelidado por "Seu Nequinho", um ex-barqueiro acostumado atravessar, junto com o pai, os cangaceiros que cruzavam o milenar Rio São Francisco, foi o primeiro a confidenciar: Ananias é filho de Lampião e Maria Bonita! Aqui todo mundo sempre soube desse segredo, agora que na época de Lampião quem era doido de andar com uma conversa dessa! Seu Nequinho ainda indicou mais algumas fontes que poderiam atestar o que ele estava dizendo e fui buscar a comprovação. Dentre as pessoas que fizeram seus relatos (e os tenho todos filmados para futuras comprovações) pode-se encontrar Servina Oliveira de Sá (prima de Maria Bonita), Eribaldo Ferreira Oliveira (sobrinho de Maria Bonita), os irmãos Osvaldo, Olindina e Maria Martins de Sá (primos de Maria Bonita), Firmino Martins de Sá (foi casado com a prima e melhor amiga de Maria Bonita: Maria Rodrigues de Sá), estes são alguns dos que confirmaram a história que se segue: Dona Maria Joaquina Conceição Oliveira, "Dona Déa", mãe da Rainha do Cangaço, estava grávida e por coincidência Maria Bonita havia engravidado quase que na mesma época. Por questão de aproximadamente dois dias, as duas mulheres viram nascer seus rebentos. Mãe e filha gerando vidas e fazendo crescer sua descendência. Pelas dificuldades impostas pela luta travada nas caatingas, onde cangaceiro vivia permanentemente em fuga, lutando contra as perseguições da polícia, filho era um entrave (…) Maria Bonita dera a luz, Lampião arquitetou deixar o filho com a sogra, para que ela criasse as crianças como se fossem gêmeas e assim aconteceu. O filho de Dona Déa ganhou o nome de Arlindo Gomes de Oliveira e o filho de Lampião e Maria Bonita foi batizado como Ananias Gomes Oliveira (…)".

Maria Bonita foi degolada em Sergipe, num ataque em que foram mortos também seu companheiro e outros cangaceiros. E, para lembrar dessas fascinantes histórias do cangaço, nada como ouvir a bela canção entoada por Gilberto Gil e Roberta Sá, Minha Princesa - em Canções, Vídeos e Mais.

Machu Pichu, mistério secular, pede socorro


Excesso de visitantes pode colocar o belo patrimônio inca em perigo



O último dia 7 marcou o centenário de descobrimento, pela civilização moderna, da cidade inca de Machu Pichu, no Peru, cuja fundação deve girar em torno de 600 anos. Construída a partir de complexas noções de astronomia e engenharia, Machu Pichu fica a cerca de 2.400 metros de altitude e sedia templos e locais sagrados daquela sociedade, cujos mistérios ainda não foram desvendados pelos homens do século 21. Em 1911 o arqueólogo americano Hiram Bingham descobriu as ruínas do que deveria ter sido uma cidade construída para esconder o imperador inca na possibilidade de uma invasão, e encontrou um vilarejo construído com complexos sistemas de irrigação e templos alinhados com os astros do espaço. Em 1987, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) elevou o local a Patrimônio Mundial, mas antes mesmo dessa classificação Machu Picchu já atraía milhares de turistas por ano.

Só no ano passado cerca de 800 mil turistas visitaram as ruínas. Para comemorar a ocasião e o sucesso da cidade, o governo peruano organizou uma série de eventos e celebrações oficiais, mas tanta popularidade começa a colocar em risco esse patrimônio, tanto que, em junho passado, a cidade nica esteve próximo de ser incluída na lista dos lugares em perigo da UNESCO. A polêmica já fez o governo peruano inclusive ameaçar fechar o local por um tempo ou ainda limitar o número de pessoas que poderiam visitar as ruínas por ano. Mas nada disso foi adiante, porque, segundo a Câmara Nacional de Turismo do Peru, 70% das rendas por turismo no Peru derivam dali, embora o dinheiro não seja revertido para a região. Na semana do centenário, uma comissão de autoridades da província de Urubamba, onde ficam as ruínas, viajou até Lima para reivindicar que o Estado solucione os problemas que a temporada de chuva do ano 2010 deixou na zona, onde várias pontes foram derrubadas, deixando povoações incomunicáveis.

Cem anos depois, portanto, Machu Pichu continua a encantar e pede socorro. Os muitos séculos que a conservaram aos nossos olhos e os homens que a fizeram merecem no mínimo esse respeito - o de que esse tesouro será preservado por seus pares em plena era tecnológica.

domingo, 3 de julho de 2011

Fundação Pró-Memória: uma história de duas décadas


A Fundação Pró-Memória (FPM) de São Caetano do Sul comemorou em junho 20 anos. Preocupada com o resgate e a divulgação histórica, a entidade inaugurou a etapa com ações e projetos na versão digital (site remodelado, facebook, twitter) e a meta de conscientizar novas gerações sobre a importância de conhecer a própria identidade pelo acesso à história local e regional. Nessas duas décadas, a cidade que a abriga passou por grandes transformações - a mais recente, uma verticalização abrupta, fruto da especulação imobiliária que praticamente pôs fim à arquitetura dos casarões ajardinados e colocou abaixo uma de suas últimas salas de cinema. Mas, afirma a presidenta da entidade, há entre os motivos a comemorar o amplo trabalho realizado pela FPM, como a publicação da revista Raízes e duas dezenas de livros; a recente criação do Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Caetano do Sul (Conprescs) e o destacado interesse demonstrado pelos jovens em preservar a memória e a história do Grande ABC. Leia, abaixo e em Canções, Vídeos e Mais, a entrevista com a presidenta, exclusiva para este blog.

Memória e Sentimento - A Fundação Pró-Memória completa 20 anos. Que trabalhos e produções da entidade a sra. destacaria nestas duas décadas, e por que razões?
Sônia Xavier - A origem da Fundação Pró-Memória de São Caetano do Sul está no Museu Histórico Municipal, que já completou 50 anos. Nestes 20 anos de atividade, podemos destacar muitas atividades, projetos e ações da instituição. A começar pela criação de um Centro de Documentação Histórica, na década de 1990, formado por documentos textuais, iconográficos, eletrônicos, fotográficos e audiovisuais, que conta ainda com uma biblioteca com cerca de 3.000 títulos, entre livros, jornais, revistas, teses e monografias. O Centro de Documentação é aberto ao público e funciona como fonte de pesquisas sobre a história local e regional. A criação da Raízes, revista de cunho histórico, também é uma das mais importantes ações da Pró-Memória. Publicada semestralmente, já conta com 42 exemplares editados e é muito procurada por leitores, apreciadores das histórias; (há) depoimentos, artigos, entrevistas e crônicas. O projeto editorial da instituição contempla ainda a edição de mais de 20 livros no decorrer destes 20 anos, de diferentes autores e sobre temas variados como a história, as artes e as tradições de São Caetano do Sul. A organização de reuniões, conferências e encontros locais, regionais, nacionais e internacionais, resultando em inúmeros documentos históricos, também marcaram a trajetória da Fundação Pró-Memória, assim como projetos de pesquisas e escavações arqueológicas no bairro da Fundação, resultando em uma vitrine demonstrativa dos alicerces da primeira igreja da cidade. Este período marcou ainda a organização de duas edições do Congresso de História do Grande ABC e a participação em todos os outros congressos ocorridos na região. Outro projeto que merece destaque é a organização de agenda histórica. Desde 2004, a Pró-Memória prepara uma agenda, com um tema específico que faz referência a algum aspecto da história da cidade, e que contém informações sobre as principais datas comemorativas da cidade e as mais significativas. Podemos dizer ainda que, nestes 20 anos, a Fundação Pró-Memória organizou mais de uma centena de exposições sobre diversos temas, sempre com o objetivo de resgatar e divulgar a história da cidade. Com certeza, um marco na história da instituição foi a realização do projeto Caminhos da Memória, que trabalhou com o patrimônio edificado local. Após um levantamento dos principais pontos de importância histórica para a cidade, cada local recebeu uma placa em cerâmica com as inscrições “Bem cultural de interesse histórico”. Para divulgar e levar ao conhecimento da população com o objetivo de sensibilizar a todos sobre a importância da preservação das edificações, realizamos três caminhadas históricas.

Memória e Sentimento - A sra. acredita que houve uma integração entre a FPM e a comunidade local (São Caetano e região)? Que tipo de iniciativas são realizadas com esse objetivo?
Sônia Xavier - Sim, creio. Houve e há integração entre a Fundação Pró-Memória e a comunidade. Nosso objeto de trabalho é o patrimônio cultural e o estímulo para o exercício da cidadania, para o desenvolvimento do sentido de pertencimento em tudo que existe no meio ambiente. A comunidade nos apoia nos diversos projetos que trabalham com História Oral, identificação de fotos, das rodas de lembranças com suas memórias e suas relíquias, e participando intensamente de cursos e palestras. As conquistas da Fundação Pró-Memória se sedimentam na interação entre a pesquisa científica, os memorialistas locais e regionais, os técnicos da instituição e os munícipes.

Memória e Sentimento
- Há uma renovação entre os memorialistas da região? De que forma o jovem é despertado para o estudo e preservação da história? Como a FPM colabora nesse sentido?
Sônia Xavier - Acredito que estão surgindo, na região, jovens cada vez mais interessados em cultivar a memória e a história do Grande ABC. Percebemos isso em nossos encontros e também nos artigos recebidos para publicação na revista Raízes, muitos escritos por jovens. Há uma preocupação da Fundação Pró-Memória em colaborar para o desenvolvimento do interesse pela memória em pessoas mais jovens. Para isto, procuramos as universidades e escolas locais para diferentes projetos e parcerias. Já realizamos um projeto chamado Museu na Escola, que levava exposições itinerantes para instituições de ensino municipais, estaduais e particulares. Atualmente, estamos desenvolvendo o projeto Vamos contar nossa História, que trabalha com a Educação Patrimonial como ferramenta de trabalhar com os alunos a importância do patrimônio material e imaterial e sua própria identidade.

Memória e Sentimento - São Caetano sofre uma grande mudança arquitetônica nessa década, com a proliferação de construções modernas e o fim dos velhos casarões ajardinados. Recentemente até mesmo um cinema de bairro, já fora de atividade mas com sua bela arquitetura preservada, foi demolido para dar lugar a mais um prédio (Cine Colonial, bairro Santo Antônio). A FPM tem alguma autonomia no sentido de sugerir a preservação destes espaços? Há ou houve alguma iniciativa nessa direção?
Sônia Xavier - Este espaço teve uma pesquisa e um projeto para transformação do local em um Centro Cultural que abrigasse uma sala de cinema, teatro, auditório e até outras linguagens culturais, o que foi obstado pela especulação imobiliária e por não termos ainda na cidade uma legislação de proteção aos bens culturais. Realizamos a pesquisa e divulgamos o valor dos bens históricos locais, tanto através de publicações, folders, impressos e jornais e colocamos placas indicativas sobre a história dos bens sinalizados. Sentimos também a grande transformação da paisagem urbana e temos procurado trabalhar o valor do patrimônio material com a população, tentando ampliar a consciência das pessoas e o seu papel como cidadãos. Com a criação, recentemente, do Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Caetano do Sul- Conprescs, e com a Fundação Pró-Memória fazendo parte dele, acredito que várias ações mais efetivas serão realizadas neste sentido.

Leia o restante da entrevista em Canções,vídeos e mais

Jorge Amado, voz imensa do Brasil

Comemorações do centenário de nascimento do escritor, em 2012, já começam a ser anunciadas



Jorge: política, literatura, polêmica e poesia na vida e nos livros


Falta mais de um ano, mas as comemorações do centenário de nascimento do escritor Jorge Amado (10 de agosto de 2012), um dos grandes da literatura nacional e cuja obra foi traduzida para mais de uma centena de países e idiomas, já começa a ser preparada em vários segmentos da sociedade. Entre eles estão o enredo de uma escola de samba, a Imperatriz Leopoldinense, e o trio elétrico carnavalesco comandado pela cantora Daniela Mercury. Na esfera política, há até mesmo um projeto de lei propondo 2012 como o ano Jorge Amado, em homenagem à obra de um autor que, como poucos, soube aproximar a literatura da alma brasileira. Para Jorge, segue a primeira homenagem desse blog – leia mais em Poemas do Tempo.

Bonequinha de luxo chega aos 50 com versão digital


Fútil e ingênua, personagem de Audrey Hepburn marcou época no mundo da moda



Audrey Hepburn como ´Bonequinha de Luxo´ no Museu de


Cera de Madame Tussauds de Londres; a seu lado, Clarissa


Os 50 anos do filme “Bonequinha de Luxo”, clássico de Blake Edwards estrelado por Audrey Hepburn, serão comemorados com a versão digital da película, cuja primeira projeção deverá acontecer no próximo dia 29 nos EUA. A restauração da obra foi a forma encontrada pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood para marcar o cinquentenário.
Inspirado no livro do jornalista Truman Capote, o filme, que estreou em 5 de outubro de 1961 em Nova York, levou o Oscar de melhor trilha sonora e melhor canção por Moon River. E o estilo da personagem de Audrey, entre a inocência e a futilidade - com óculos escuros grandes, vestidos Givenchy, pérolas, cigarrilha para fumar e cafés à porta da joalheria Tiffany´s -, acabou por definir, no curioso mundo da moda, muito da palavra glamour, ainda que na irreverente década de 60.

domingo, 26 de junho de 2011

A história do movimento negro contada por jornais e revistas






Publicações do começo do século passado dedicadas à defesa dos negros podem ser acessadas pelo site do Arquivo Público de SP

Quem quiser saber mais sobre a história do movimento negro no Brasil pode acessar o site do Arquivo Público do Estado de São Paulo. Ali estão disponíveis para consulta 23 títulos de jornais e revistas publicados por representantes do movimento negro nas primeiras décadas do século 20. As prioridades são as que perduram até hoje; ou seja, o combate ao preconceito e a afirmação social da população negra.

Entre estes periódicos está o jornal A Voz da Raça, da Frente Negra Brasileira. A publicação, cuja origem data de 1933, circulou até 1937, com 70 edições. Outra leitura disponível é a Quilombo (1950), revista que tinha a função de articular e divulgar a Convenção Nacional do Negro Brasileiro. Jornais e revistas também divulgavam eventos do dia a dia da população negra, tais como festas, bailes, concursos de poesia e beleza e que raramente apareciam nos veículos da chamada grande imprensa.









Para acesso aos documentos há dois caminhos (jornais e revistas): http://www.arquivoestado.sp.gov.br/jornais.php http://www.arquivoestado.sp.gov.br/a_revistas.php









Paz para as Avós da Praça de Maio







Longa jornada: avós de maio seguem na busca por filhos e netos desaparecidos na ditadura argentina




Elas buscaram – e continuam buscar - por seus filhos e netos, vítimas da ditadura argentina. E agora podem, merecidamente, ver seu trabalho reconhecido pelo prêmio Nobel da Paz; candidatura foi lançada na última quinta

As avós da Praça de Maio, na Argentina, poderão concorrer ao Prêmio Nobel da Paz. A apresentação da candidatura foi lançada na última semana pela ONG ´Avós com a Paz´com o intuito de que seja reconhecida a luta destas mulheres para encontrar os filhos assassinados durante a ditadura naquele país (976-1983) ou, como vem acontecendo, para pelo menos poder abraçar seus netos, muitos deles adotados ainda bebês por representantes do mesmo regime que assassinou seus pais.
Na cerimônia de lançamento da candidatura esteve presente a presidente das "Avós", Estela de Carlotto, assim como uma das netas resgatadas das mãos da família do militar que a roubou após assassinar seus pais, Victoria Montenegro. Estela disse que o Nobel seria uma "grande alegria", mas o melhor prêmio são mesmo cada um dos 103 netos já encontrados, embora ainda falte localizar outros 400.
"A tarefa é difícil e com toda certeza, quando todos forem localizados, nós já não estaremos aqui para vê-lo, mas deixaremos o testemunho aos nossos outros filhos e netos porque isto é uma luta coletiva", afirmou. Para ajudar no trabalho, as avós criaram o Banco Nacional de Dados Genéticos, onde estão armazenadas as amostras de sangue de todas as avós de crianças desaparecidas, para permitir a investigação dos casos que surgirem no futuro, inclusive após a morte delas. Estela, de 80 anos, continua à procura de seu neto, que neste completaria 33 anos e a quem sua filha Laura, assassinada pelos militares, batizou como Guido. Uma busca que, é fácil saber, não vai cessar até sua morte. "Nós avós, cada vez estamos mais velhinhas, mas, embora caminhemos devagar, o coração e a cabeça estão fortes. A tenacidade de uma avó ou de uma mãe não se perde com o passar dos anos", garantiu.
Os netos já localizados abrem espaço para a esperança no coração destas mulheres. É o caso de Victoria Montenegro, que conheceu o que aconteceu com seus pais biológicos já na idade adulta. Victoria nasceu em 31 de janeiro de 1976. Treze dias depois do sequestro de seus pais, e posterior assassinato, ela foi adotada por um coronel do Exército - o mesmo que ordenou a morte de seus pais. Segundo contou na última quinta-feira, o pai adotivo a fez acreditar que o tema dos desaparecidos era uma farsa e que as Avós da Praça de Maio eram "velhas loucas que queriam destruir sua família cristã".
A verdade sobre sua origem só chegou aos 25 anos. "Graças às Avós a memória dos meus pais continua viva, apesar da existência de um regime horrível que tentou eliminá-los para sempre. A elas devemos o que somos", afirmou. A ditadura militar da Argentina resultou no desaparecimento de mais de 30 mil pessoas. Quinhentas crianças foram sequestradas ou nasceram no cativeiro de seus pais.
Para conhecer melhor o trabalho das Avós acesse www.abuelas.org.ar


Leia em Eu Conto o texto Alvo Anoitecer, sobre uma avó muito especial

domingo, 19 de junho de 2011

Sigilo eterno. A história de um País pode ser enterrada?




Negar o acesso à informação histórica é ferir de morte a construção da identidade nacional

O Brasil discutiu na última semana a questão do “sigilo eterno” para documentos que contam parte da história do País. Para o ex-presidente da República e senador José Sarney (PMDB-AP) o Brasil não deve “abrir feridas” ao revelar todo o seu passado, mas tornar públicos apenas os documentos “mais recentes”. A ministra Ideli Salvatti (Relações Institucionais) também afirmou que a presidente Dilma Rousseff quer manter a possibilidade do sigilo eterno no projeto que trata do acesso a informações públicas.

Pela legislação atual, documentos públicos classificados como ultrassecretos ficam em sigilo por até 30 anos, mas o prazo pode ser renovado indefinidamente. Caso o projeto que tramita no Senado seja aprovado, o máximo de sigilo para qualquer documento público será de 50 anos. Pela nova regra, os papéis ficarão longe do público se forem reservados (5 anos), secretos (15 anos) e ultrassecretos (25 anos) --neste caso é permitida uma renovação por igual período.

O projeto fixa o conceito de que os cidadãos devem ter acesso a tudo o que é produzido na esfera pública, e haverá prazo fixo para fornecer qualquer documento produzido pelos três Poderes. E você, é a favor da manutenção do “sigilo eterno”? Será que a história pode simplesmente ser enterrada, como se os fatos nunca tivessem existido? Que tipo de ensinamento seria esse – o do esquecimento?

Por essas e outras, vale lembrar versos da Cancíon por La Unidad Latino americana, de Pablo Milanés e Chico Buarque, aquela mesma que avisa que a história atropela indiferente todo aquele que a nega: Quem vai impedir que a chama/ Saia iluminando o cenário/Saia incendiando o plenário/ Saia inventando outra trama?/ Quem vai evitar que os ventos/Batam portas mal fechadas/Revirem terras mal socadas/ E espalhem nossos lamentos? E enfim quem paga o pesar/ Do tempo que se gastou/ De las vidas que costó/ De las que puede costar? (...) Ouça em Canções, Vídeos e Mais.

Acervo Brasil Nunca Mais é repatriado para o Brasil








Iniciativa de religiosos iniciada no período da ditadura militar brasileira reúne um milhão de fotocópias de processos do STM e poderá ser consultada pela internet


A semana que passou marcou o repatriamento do acervo Brasil: Nunca Mais, projeto desenvolvido clandestinamente no período da ditadura militar brasileira (entre 1979 e 1985) sob coordenação dos religiosos de São Paulo Dom Paulo Evaristo Arns (à época arcebispo) e Jaime Wright, pastor presbiteriano. O acervo, que reúne um milhão de fotocópias de 707 processos do Superior Tribunal Militar (STM) e revela a extensão da repressão política daquelas décadas, foi enviado pelo arcebispo ao Conselho Mundial das Igrejas (CMI) nos Estados Unidos como medida de segurança e agora finalmente retorna ao Brasil. O conteúdo deverá em breve ficar disponível na internet, pela página do Arquivo Público do Estado de São Paulo.
Dom Paulo também é autor do livro Brasil: Nunca Mais, que traz relatos sobre a violência do período e nomes de envolvidos em casos de torturas. Na ocasião em que desenvolviam o projeto, os religiosos ficaram sabendo que os processos da Justiça Militar poderiam ficar até 24 horas com advogados dos envolvidos e realizaram fotocópias dos documentos, enviados aos EUA por precaução. Um kit dessas cópias chegou a ser colocado para pesquisa na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) em 1988, mas parte das páginas de alguns processos desapareceram, principalmente as que continham nomes de torturadores.
O projeto de repatriamento é resultado de seis anos de trabalho. São 543 rolos de microfilmes, cuja impressão totaliza 12 volumes de 6 mil páginas. O projeto Brasil Nunca Mais Digital é iniciativa do Ministério Público Federal, Armazém Memória e do Arquivo Público do Estado de São Paulo, com o apoio do Arquivo Nacional, da OAB/RJ, do Center for Research Libraries (EUA), do Conselho Mundial de Igrejas (Suíça) e do Instituto de Políticas Relacionais.
Para mais informações acesse o site oficial do projeto: http://www.prr3.mpf.gov.br/bnmdigital




Já o livro Brasil: Nunca Mais está na 37ª edição. Lançado em 15 de julho de 1985, foi reimpresso mais de 20 vezes nos dois primeiros anos. Para os representantes de entidades ligadas aos direitos humanos presentes na solenidade que marcou o repatriamento dos documentos, no último dia 14 em São Paulo, o acesso ao arquivo é passo fundamental para que as novas gerações possam ter conhecimento desse obscuro período, apropriadamente batizado de “anos de chumbo”.
Embora o ano de 1985 seja considerado como o que encerrou o período militar no Brasil, pouca gente sabe que a espionagem de agentes de antigo Deops continuou ativa em pleno retorno democrático, como se pode ler na matéria abaixo. O arquivo do Deops, inclusive, também está disponível para consulta no Arquivo Público do Estado de SP que, além da página na internet, possui boa estrutura para pesquisas em seu espaço físico, à avenida Cruzeiro do Sul 1777, de terça a sábado – fone 2089-8100 ramal 8151.

A ditadura inconformada

Por Maria Angélica Ferrasoli (*)


Como espiões do extinto Deops, infiltrados no governo de SP, continuaram a perseguir lideranças sindicais, políticas, instituições e entidades em plena democracia.

Uma assembleia de trabalhadores vigiada, um espião infiltrado num curso sindical, agentes da polícia se passando por estudantes. Assim descritas, as situações logo remetem ao longo período da ditadura militar brasileira (1964-1985), mas, sabe-se agora, se fizeram presentes também nos anos de redemocratização e na primeira década da democracia no país. O agravante é que esta espionagem, ocorrida de 1983 a 1999, foi protagonizada não pelo terrível Departamento Estadual de Ordem Política e Social (Deops), o principal órgão de repressão então extinto, mas sim por um aparentemente inofensivo e burocrático serviço de “comunicação social” da Polícia Civil de São Paulo. É o que revela, 27 anos depois, o arquivo da antiga Divisão Policial de Informações Sociais do Departamento de Comunicação Social (DIS/DCS) da Polícia Civil do Estado de São Paulo, composto por 1.220 pastas de dossiês pessoais e temáticos, 52.172 fichas remissivas e, desde o final de março, aberto à consulta no Arquivo Público do Estado de São Paulo.

Na mira dos arapongas, alguns identificados como ex-integrantes do Deops (até mesmo a forma de arquivamento dos papéis é semelhante), estão os “suspeitos de sempre” e outros inexplicáveis, entre autoridades públicas, partidos políticos, artistas, faculdades, entidades religiosas e dezenas de sindicatos e seus representantes. Para o coordenador do Arquivo Público e professor de História da USP, Carlos Bacellar, houve evidentemente um desvio de função no papel do DCS. “Apesar do fim do Deops, a espionagem continuou dentro do Estado. Não se sabe quem o fazia nem para quem ou para quê, mas pela documentação se percebe que o nível de conhecimento chega até o secretário”, aponta.

Instalado em 1983, quando o governador eleito Franco Montoro assumiu o posto, o DCS chegou a vigiar inclusive seu criador, e até que sua atuação enviesada fosse descoberta e encerrada por Mário Covas, em 1999, passaram pela chefia da Segurança Pública do Estado nada menos que 14 secretários. Muito do material que integra o acervo – ao menos 50% – é composto por clippings (recortes) de jornais, sendo a outra metade relatórios das investigações. Em geral, os agentes do DCS assinavam em código (são os “Gama”, seguidos de numeração), mas nos casos em que o material é enviado por delegacias de outras regiões há assinaturas nominais. Entre os que respondem pelo DIS/DCS, pelo menos dois – o delegado Clyde Gaia da Costa e o diretor Sylvio Pereira Machado – estão na lista de integrantes do Deops citados pelo grupo Tortura Nunca Mais, que luta pelo esclarecimento das circunstâncias de morte e desaparecimento de militantes políticos durante o regime militar.

“A questão é que, enquanto o Deops vigiava oficialmente o clandestino, o subversivo, no DCS esse papel se inverte, há uma ação clandestina do órgão sobre fatos abertos, públicos. E coisas que não fazem sentido – por exemplo, investigar um show do Axl Rose, ou, ao lado de artistas já vigiados anteriormente – Chico Buarque, Plínio Marcos, o ator Alexandre Frota, “envolvido numa briga”, compara o coordenador do Arquivo, lembrando que há toneladas de outros papéis dentro da estrutura da polícia aos quais ainda não se tem acesso e que “apenas pesquisas futuras poderão revelar mais”. O acervo também traz curiosidades como a vigilância no Instituto Metodista de Ensino Superior, de São Bernardo, faculdade que na década de 80 reunia professores engajados na luta contra a ditadura militar e estudantes que acompanhavam de perto as grandes greves e lutas sindicais da região, além do movimento pró-eleições diretas; capciosos ofícios escritos pelo então prefeito Jânio Quadros e até mesmo curiosas “reflexões” de agentes, como as que integram relato de uma investigação feita pela delegacia seccional do ABCD sobre o então líder metalúrgico Luiz Inácio Lula da Silva em julho de 1983: “Quanto ao prestígio político de ‘Lula’, podemos afirmar que na atualidade não possue (sic) o mesmo carisma que tinha no período de 1979 e 1980 (....) Não é bom político e não tem acessores (sic) de visão, pois o deixaram lançar a candidatura a governador, sendo que nunca poderia se eleger, ao passo que ganharia fácil uma cadeira na Câmara Federal ou Estadual...”.

Movimento social e sindicatos

Outros temas de relevância na papelada do DCS são as Diretas-Já, inclusive com fotos produzidas pelos espiões e esclarecimentos sobre locais liberados para os comícios, convocação e repercussão de greves, e a preparação e desenvolvimento do I Conclat, o Congresso da Classe Trabalhadora, realizado no Pavilhão Vera Cruz, em São Bernardo, no ano de 1983. Entre os muitos sindicatos sob vigilância estão o dos Bancários de São Paulo, Associação dos Professores do Estado de São Paulo (Apeoesp), Metalúrgicos do ABC. Deste último, foi arquivado até mesmo documento com papel timbrado da entidade, o que demonstra o grau de infiltração do agente. Em outro relato, dez anos depois do Conclat, um investigador acompanha, provavelmente como aluno, curso sobre organização no local de trabalho ministrado pelo Smabc em Diadema. Já nos Bancários de São Paulo, além da descrição da assembleia que avalia uma greve geral no ano de 1991, o agente Gama 41 da DIS/DCS faz a listagem da frota de veículos ali estacionados, com a respectiva informação sobre modelos e placas dos automóveis.

Em muitas das fichas dos sindicalistas vigiados pelos agentes estão dados pessoais como filiação, moradia, número de RG, profissão. É curioso lembrar que, muitas vezes, no estádio de Vila Euclides, Lula pedia para que fosse repetida a decisão das assembleias, acrescentando, ironicamente, que era para os espiões poderem anotar a informação completa. Além de Lula, estão fichados no DCS os metalúrgicos Vicentinho e Heiguiberto Della Bella Navarro, o Guiba. Entre os bancários de São Paulo, os ex-presidentes da entidade Luiz Gushiken e Ricardo Berzoini.

“Olha, que tudo era vigiado constantemente eu sabia, sabia que havia informantes nas assembleias. Mas não tinha dimensão do quanto, de como era ostensiva e profunda essa vigilância”, afirma Guiba, que recentemente foi buscar informações sobre a espionagem em Brasília, já que pretende reivindicar a indenização prevista para os que sofreram perseguição política na ditadura militar. “Agora, assusta muito mais saber que a própria polícia que pensávamos ser da democracia também nos vigiava”, destaca. Para Guiba, tanto aqueles que oficialmente fizeram parte dos órgãos de repressão na ditadura quanto esses novos casos de espionagem enfim revelados devem ser julgados e punidos. “Toda essa gente estava prestando um desserviço à nação”, avalia.

A apuração de responsabilidades, por constituir clara ilegalidade e violação à democracia – além, obviamente, do uso do dinheiro público – também é defendida por Ricardo Berzoini, que viria a se tornar ministro no governo Lula e deputado federal pelo PT. “Nos anos 80, 90, havia uma forte infiltração policial nos sindicatos, muitas vezes detectávamos a presença de pessoas estranhas nos locais de encontro, assembleias. Mas até onde se tinha conhecimento eram pessoas da P2 (o serviço reservado da Polícia Militar) e da PF. Nunca tivemos informações sobre vigilância da Polícia Civil”, afirma. Para o deputado, é realmente incrível que isso tenha ocorrido já no governo democrático de Franco Montoro e se estendido por tantos anos. “Conhecendo o Montoro como conheci tenho certeza de que ele não concordaria com esse tipo de procedimento”, afirma, acrescentando que é necessário um levantamento para que sejam detectados os responsáveis pela ação no DCS. “O triste é que esse veio autoritário parece que não acaba nunca”, lamenta, fazendo coro com o coordenador do Arquivo do Estado. “É a ideia da perseguição (do governo militar), de ver a sociedade como inimiga”, avalia Bacellar.

Consultas
Criado em 1924, o Deops foi extinto por decreto em 6 de março de 1983, pelo então governador José Maria Marin, que substituía o biônico Paulo Maluf, afastado para disputar as eleições na Câmara Federal. Nove dias depois, ainda sob esta cultura da espionagem, Montoro assumiu o governo de São Paulo. Na turbulência daqueles anos, em que a democracia apenas engatinhava, muitos documentos importantes para recontar a história do país simplesmente foram varridos para debaixo do tapete e desapareceram. No caso DIS/DCS, a documentação ficava num arquivo de acesso restrito no prédio onde funcionava o órgão, no Palácio da Polícia, bairro da Luz.

Desde 1999, quando Mário Covas ordenou sua transferência, o acervo passou para o Arquivo Público do Estado, recebendo tratamento de conservação e análise. A identificação da lógica de organização do material demonstrou semelhança com a adotada pelo Deops: fichas remissivas e códigos numéricos e alfanuméricos para identificar e localizar os papéis. Só no último 26 de março, porém, o acesso à consulta foi liberado, com a publicação de resolução no Diário Oficial do Estado. No Arquivo também é possível consultar a documentação do Deops, atualmente a mais procurada pelos pesquisadores. As consultas, gratuitas, podem ser feitas de terça a sábado das 9h às 17h, sendo 16h o horário-limite para solicitação de material. O Arquivo Público do Estado fica na Avenida Cruzeiro do Sul, 1.777, em Santana, ao lado da estação Tietê do metrô (fone 2089-8100).


Os ofícios de Jânio
Um risível mau humor autoritário e o estilo peculiar de expressão de JQ podem ser conferidos no acervo do DCS
Quem conheceu a verve do ex-presidente da República Jânio da Silva Quadros poderá se deleitar nas pesquisas do acervo do DCS. Muito além do “fi-lo porque qui-lo”, o homem deposto pelas “forças ocultas” e que “desinfetou” a cadeira para afastar o perigo das “nádegas impróprias” do então concorrente à prefeitura de SP, Fernando Henrique Cardoso, dá um show de autoritarismo com seu peculiar estilo, em comunicados oficiais enviados a autoridades como o governador Franco Montoro e o secretário de Segurança Pública Eduardo Muylaert Antunes.

Para Montoro, em 24 de fevereiro de 1987, JQ começa já atacando: “Leio, nos jornais de hoje, uma notícia estúpida”, e relata que “determinado vereador do PT estaria concitando o público a não pagar tarifas da CMTC e empresas permissionárias”, o que, entende, constituiria crime. Em seguida cobra: “Confio em que vossa excelência, autoridade responsável pela ordem e lei neste Estado, não permitirá este atentado”. No comunicado a Muylaert, o assunto é o anúncio de uma greve na CMTC. “Solicito de vossa excelência que esteja convenientemente preparado para que os transportes públicos não sofram colapso no dia 1 de setembro próximo”, avisa. Era o ano de 1986, e ele pede a cessão – como diz já ter pedido a ministros e seus comandos em São Paulo – de todos os motoristas possíveis (grifo do documento), para evitar a paralisação.

Na mesma ocasião, e ainda por causa da greve nos transportes, pega pesado no ofício endereçado a Jether Abreu, da CMTC. “Há rumores de greve na Companhia. Que não aconteça. Processo todos os grevistas, para despedi-los, e recorro à Polícia Militar, aos Bombeiros e às Forças Armadas para dirigir os veículos. (...) Minha reação será igual à dos estagiários da CET: processo e despedida decorrente (...) Repito-o: se desejarem os antigos e leais servidores da Companhia, pelo menos, um abono de Natal e uma melhoria salarial para o próximo ano, que viajem comigo para Brasília. Lá está a sede do poder e a chave do cofre. Não se enganem”, ameaça Jânio.

O caso Metodista
Faculdade foi vigiada durante três anos, com especial atenção a 1984, quando estudantes invadiram a reitoria

Da mesma forma que os sindicalistas, também os estudantes do então Instituto Metodista de Ensino Superior, em São Bernardo – em especial os do curso de Jornalismo – comentavam, na década de 1980, uma possível vigilância no campus. A preocupação, porém, não ia além de um ou outro boato, já que para a maioria daqueles alunos a ditadura era coisa do passado. A volta dos exilados, as grandes assembleias no estádio de Vila Euclides, a fundação do PT e os comícios pelas Diretas-Já: esse, sim, era o presente daquela geração, distante de vivenciar na pele o trauma das torturas e barbáries dos militares. O fato, porém, é que a Metodista também foi alvo dos arapongas do DCS. Entre os documentos, de 1984 a 1987, estão citações de uma palestra que teria sido feita pelo professor Armando Azzari, na qual ele teria atacado “o sistema governamental de maneira injuriosa”, e a invasão da reitoria em março de 1984.

“Conf. B.O. 324/84 – 2º. DP-SBC e Inf. nº.362/84 DCS/DIS; no dia 12/03 p.p, às 21:00hs., alunos da Fac. de Com. do nominado invadiram a Reitoria e ali se instalaram em forma de alojamento, após haverem iniciado um movimento de greve, motivado pela demissão do prof. Armando Azzari, da Fac. De Comunicação. O reitor ingressará hoje, 13/03, com um pedido de reintegração de posse, na Justiça (17-P-1-248)”, lista uma das anotações da ficha da entidade – quem participou da invasão, porém, lembra que as reivindicações iam além da reintegração do docente, já falecido. Além desse informe, há outros dois oriundos de investigação do próprio DCS e de documento reservado da “Sec. Pol. do ABCD”, mas este último, por exemplo, não tem pasta correspondente para consulta. As demais anotações da ficha (outras quatro) são clippings de jornais sobre a paralisação de 1984 e um protesto contra o aumento das mensalidades em 1987.

(*) matéria publicada na revista Fórum em maio de 2010

domingo, 12 de junho de 2011

Salve João Gilberto, salve a Bossa Nova





João Gilberto, genial músico e a melhor tradução da Bossa Nova, fez 80 anos no último 10 de junho. Em homenagem ao moço que azucrinava gatos e vizinhos – a lenda mais corrente e engraçada é de que o gato se suicidou por suas repetidas tentativas de perfeição -, o blog posta Fotografia em Canções, Vídeos e Mais. E deseja vida longa ao baiano de Juazeiro.

Após cem anos, um jovem Teatro Municipal














Teatro Municipal de SP é reinaugurado após nova reforma; em 12 de setembro de 1911, sua abertura causou o primeiro congestionamento de SP

A reabertura do Teatro Municipal, no último final de semana, é uma oportunidade de viajar pela história de São Paulo a partir de um de um de seus mais belos marcos. Afinal, o teatro completa 100 anos no próximo 12 de setembro e, embora já tenha passado por duas reformas anteriores, só agora, segundo os organizadores, conseguiu recuperar brilho semelhante à inauguração, já que detalhes de seu acabamento, apagados pelo tempo, puderam ser restaurados.

O Municipal foi idealizado nos moldes dos melhores teatros do mundo para atender principalmente à ópera, a primeira forma artística e de lazer típica da burguesia e em virtude do grande número de italianos que viviam em São Paulo. Para criá-lo, a Câmara Municipal desapropriou, em 1903, o terreno do Morro do Chá. Cláudio Rossi foi o autor do projeto; Domiziano Rossi fez os desenhos e Ramos de Azevedo foi o responsável pela construção.

Os materiais também foram encomendados pelo escritório Ramos de Azevedo, em vários países. A armadura de ferro teria vindo de Düsseldorf, o ferro artístico em Frankfurt (ambas na Alemanha);, o bronze artístico em Berlim, Paris e Milão; os mosaicos vieram de Veneza, os mosaicos de paviment, de Nova York e Berlim e os mármores de Siena, Verona e Carrara, na Itália.

Após a reforma, os 1,5 mil lugares foram mantidos, com acréscimo de seis assentos para obesos e quatro lugares para cadeirantes. O palco foi o único a passar por uma mudança mais intensa, para modernização. Segundo Lilian Jaha, arquiteta do Teatro Municipal, as paredes do fosso – onde costuma ser instalada a orquestra – recebeu inclinação para melhorar o retorno do som para o palco.

A iluminação e a infraestrutura do palco também passaram por reforma. Os espetáculos a serem apresentados no teatro contarão com um sistema computadorizado de som e terão mais liberdade no cenário graças ao reforço de varas que aguentam até 900 kg. A capacidade das anteriores era de até 200 kg. A programação da temporada 2011 do Teatro Municipal de São Paulo já foi divulgada e pode ser consultada no site do teatro.


Brilho e fotografias a magnésio - Sua inauguração, segundo jornais da época, deu origem ao primeiro congestionamento de SP, com mais de cem carros. A abertura, com a ópera Hamlet, de Ambrósio Thomas, é descrita pelo jornal Gazeta Artística: "Esteve deslumbrante a inauguração do Teatro Municipal pela companhia do barítono Titta Ruffo. Desde que anoiteceu o teatro ficou interior e exteriormente iluminado. Nas vizinhanças via-se numeroso público, carros e automóveis, com pessoas da melhor sociedade, que admiravam o belíssimo panorama. O Viaduto estava repleto. Pouco depois das 20 horas começaram a chegar os espectadores, todos em traje de rigor. A apresentação terminou às 12 horas e 25 minutos da noite, no meio ao grande entusiasmo do público. No interior do teatro foram distribuídas riquíssimas 'plaquettes', contendo a descrição e o histórico do teatro até sua inauguração. Durante o espetáculo foram tiradas muitas fotografias a magnésio. No jardim permaneceram numerosas famílias até tarde da noite".


Em 1922, o teatro sediou a Semana de Arte Moderna, que revolucionou o panorama artístico brasileiro. Desde sua inauguração, o Municipal foi palco para artistas nacionais e internacionais, como os cantores líricos Enrico Caruso e Maria Callas, as bailarinas Isadora Duncan e Anna Pavlowa, os dançarinos Nijinski e Baryshnikov, as atrizes Itália Fausta e Clara Della Guardia e os músicos Ravi Shankar e Duke Ellington. "Seu efeito simbólico arquitetônico e urbanístico externo se equiparava ao prodigioso poder de catalisação cultural que emanava internamente do seu palco. Nesse sentido, o teatro atuava como uma caixa de emissão e repercussão de símbolos em igual", analisou o historiador Nicolau Sevcenko.

Foto: Teatro Municipal,1920/Divulgação

Ciclo de palestras discute a região do Grande ABC
























Entre os temas estão os patrimônios cultural e ambiental e a ferrovia São Paulo Railway (foto)

Depois do congresso realizado em Diadema no final de maio, um novo ciclo de debates sobre a história da região acontece em São Caetano, dessa vez abordando temas como os patrimônio cultural e ambiental, ferrovia São Paulo Railway e a formação de uma comunidade imaginária no Grande ABC.
As inscrições para participar das palestras podem ser feitas até dia 21 de junho, pelo e-mail fpm@fpm.org.br, informando e-mail e telefone de contato. Entre os estudiosos presentes estarão os professores Renato Dotta, Maurício Piqueira, Mariana Cristofi e Palmira Petratti.

domingo, 5 de junho de 2011

Depois daquela quermesse



Muito populares entre os jovens em meados do século passado, festas deram origem a amores que sobrevivem até hoje




Na foto, Vilma e José na época em que começaram a namorar em uma quermesse e cujo casamento completa Bodas de Ouro neste ano



Paçoca, chapéu de palha, milho assado, quentão . E, pra aquecer ainda mais corpo e coração, um belo par de olhos – promessa de namoro ou amor da vida inteira. Pois é. Para muito além das quadrilhas e das bochechas coradas de frio ou rouge (que ainda não era blush), as quermesses foram responsáveis pelo encontro de muitos casais nas décadas de 1950 e 1960. Eventos disputadíssimos pelos brotinhos de então, as festas dedicadas aos santos (entre eles o casamenteiro Antônio) eram esperadas por uma juventude acostumada ao footing das pracinhas e aos elegantes cinemas de bairro – oportunidade única para deixar vir à tona o espírito caipira tão enraizado e, mais ainda, sua contagiante alegria.

Foi numa dessas quermesses do passado – mais precisamente no ano de 1959 – que a operária Vilma encontrou o operário José. Eles viviam em São Caetano do Sul, cidade do ABC paulista, região que passava por grande crescimento industrial e atraía migrantes de vários pontos do País – inclusive do interior do Estado, caso dos dois. Vilma trabalhava na Cerâmica Santa Maria, que ficava na rua Wenceslau Brás. Ali, tinha conhecido uma das irmãs de José e, embora já tivesse visto o moço algumas vezes, nenhum dos dois tinha tido coragem de se aproximar. Naquele junho, como era tradicional, a cidade realizava uma grande quermesse na rua Manoel Coelho – justamente entre a avenida Goiás e onde hoje se localiza o shopping São Caetano, em área atualmente ocupada por um estacionamento. “Tinha pastel, pipoca, barraquinhas, música pelo alto-falante. Ele estava lá com os colegas, veio conversar e perguntou: ´Quer namorar comigo?´. ´Vou pensar´, respondi, porque naquele tempo era assim, não dava pra responder na hora”, conta Vilma Sasso Alonso, hoje com 72 anos e cujo casamento com José completa Bodas de Ouro no final deste ano.

José, que era metalúrgico na Laminação Nacional, em Utinga, Santo André, se recorda também das músicas que embalavam as quermesses. Não se restringiam às típicas, de quadrilha – pelos alto-falantes vinham sucessos da época e esperadas e românticas dedicatórias. “Lembro muito bem que tocava Boneca Cobiçada”, conta. As noites de sereno evocadas na música acompanharam o casal por todos os meses de junho dos anos seguintes, e não foram poucas as quermesses das quais participaram como namorados e, após 1961, já casados. Com uma única filha, o casal voltou a frequentar as quermesses com assiduidade quatro décadas depois daquela que marcou seu inesquecível encontro, dessa vez unidos por um objetivo tão ou mais afetivo: ver dançar a caipirinha Beatriz, neta que neste junho completa 19 anos.

Mais de 200 quilômetros distante da paulista São Caetano, a cidade mineira de Poços de Caldas também reunia seus jovens nas festanças e arraiás. Não necessariamente eram comemorações juninas: as igrejas aproveitavam as datas dos santos padroeiros para organizar quermesses. A jovem Dirce, vigiada de perto pela avó, que só consentia passeios se estivessem vinculados a atividades religiosas, ajudava numa das barraquinhas quando começou o flerte com Victor. Era 1957, festa da Igreja de Nossa Senhora Aparecida: “Eu trabalhava na loja de doces Mesquita e já tinha visto o Victor algumas vezes. Mas foi nesse dia que o primo dele, o Zequinha, nos aproximou, e logo começamos a namorar”, relembra Dirce, 71 anos. Foi também numa quermesse, mais adiante, que a avó os flagrou juntinhos. “Fazia muito frio e eu usava o cachecol dele. Minha avó nos viu e achou um absurdo, dizendo que moça direita não fazia essas coisas”, relata.

A saída foi Victor procurar a família da moça e oficializar o namoro. Apesar das muitas restrições – vigilância em casa e nas saídas do casal – eles puderam participar de várias outras quermesses e passeios. O circuito extrarreligioso, nada apreciado pela avó, incluía os cines São Luiz e Vogue (palco também de shows, como o de Nelson Gonçalves, lembrado por Dirce) e os bailes no Country Club. Victor Geraldo e Dirce dos Santos, que se casaram em 1961 e vieram para São Paulo poucos anos depois, construíram suas carreiras como garçom e auxiliar de enfermagem. Hoje aposentados, comemoraram Bodas de Ouro em maio passado, ao lado dos três filhos e um casal de netos. Ainda gostam de ir a quermesses, especialmente Dirce que, além das barraquinhas, aprecia a diversão do bingo – talvez só para contrariar aquele velho dito de sorte no amor, azar no jogo.